Em uma pesquisa feita pelo IBGE e que virou reportagem do portal de notícias G1 há cinco anos atrás, quando nosso país "ainda" totalizava 190.755.799 milhões de habitantes, os migrantes, ou seja, aqueles que saíram de seus estados de origem para outras fronteiras nacionais, totalizavam um número maior do que 27 milhões de pessoas (14,5%) da população. Isso quer dizer que a cada dez pessoas que você encontrar nas ruas, pelo menos uma vai conversar contigo soltando aquele sotaque que você acha engraçado, bonito e, logicamente, bem diferente do seu. Só no eixo Rio/São Paulo, residem mais de 10 milhões de brasileiros que abandonaram suas cidades, muitas vezes, em busca de oportunidades melhores de trabalho. Nordestinos são muitos... Uma incrível quantidade de pessoas que em sua grande maioria se notabilizaram pela disposição no trabalho, seja ele qual for. Mas a mesma unanimidade que agrega ao nordestino uma característica bem peculiar para a labuta, o transforma em alvo de um dos apelidos mais preconceituosos batizados pelos nascidos nas duas maiores cidades populacionais do Brasil.
"Ah é tudo Paraíba!"
Está aí uma frase que os cariocas e paulistas adoram, mesmo quando o sotaque nem mesmo é nordestino. Na realidade, eles tem um outro "ditado regional popular" que mostra o quanto isso pouco importa para eles:
"Pra mim, saiu do eixo Rio/São Paulo é tudo Paraíba..."
Qual migrante morador da cidade maravilhosa ou da terra da garoa nunca escutou essa frase? Um preconceito que de tão enraizado na sociedade brasileira, torna-se ironicamente carinhoso, pois a grande maioria passa a dizer sem maldade, intenção de ferir, atacar, desprezar... Porém, com uma vontade bem notória de mostrar com um certo "q" de deboche o seguinte pensamento:
"Você não é daqui, meu caro..."
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O rei Roberto Carlos, nascido em Cachoeiro de Itapemirim - ES, mas mora no Rio desde a juventude. (fonte da imagem: http://www.luizberto.com/a-musica-do-mundo-peninha/roberto-carlos-76-anos) |
Na realidade os que sempre moraram em seus estados jamais vão compreender a dificuldade que é de se reinventar em uma outra terra que, embora também brasileira, possui uma cultura tão diferente em vários sentidos. Mas quando você se muda, existe um inimigo e aliado com o mesmo nome acompanhando você... O tempo. Primeiro ele te dilacera. Te faz acreditar que a adaptação não vai acontecer, te leva a lembrar incessantemente de um passado recente, onde você andava por onde conhecia, falava o que todos entendiam e podia se vestir sem medo de escutar uma piada caipira ou receber uma risadinha do canto de boca. Mas depois o tempo te fortalece. Vai inserindo você naquele meio, na forma de se expressar, através dos amigos que constrói, na adaptação ao layout do local e por fim, você passa, realmente, ironicamente, devotamente e porque não dizer, misteriosamente, a fazer parte daquele lugar.
Aí você se se pergunta? Como isso pode ser? Qual explicação para isso? Talvez a resposta não seja de um novo vínculo e sim de um nó que foi desatado sem que se percebesse. O jovem escritor colunista Alberto Brandão Publicou um texto no site papodehomem.com.br chamado: "O que ninguém conta sobre mudar de cidade". Ele resume com bastante propriedade em uma frase como nos desligamos aos poucos de uma cultura para nos adaptarmos a outra.
"Um dia voltamos para visitá-los (refere-se aos amigos) e eles têm assuntos que não conseguimos mais acompanhar. Nossos interesses não cruzam como antes e tudo parece meio fora de sincronia. O peso da amizade de tantos anos faz o trabalho de manter a união, mas sentimos que o compasso vai se perdendo."
E quando isso acontece (e pode ter certeza que acontece mesmo) o migrante se sente realmente distante do seu lugar de origem. E é exatamente na fronteira entre os costumes desprendidos e absorvidos, que vem a confortante descoberta de que ser brasileiro não é ter apenas uma cultura, um sotaque, e até mesmo um estado federativo. Como diz o narrador Luís Roberto, "esse país de dimensões continentais chamado Brasil", nos proporciona a sensação de que temos um pedaço de nós em muitos cantos por onde passamos, visitamos e moramos.
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Pelé, o rei do futebol. Nascido em Três Corações - MG e consagrado em Santos - SP. (fonte da imagem: http://blogdoodir.com.br/2010/10/duas-historias-sobre-pele/) |
Por isso, senhores que jamais abandonaram seus estados... Vou tomar a liberdade de invadir e inverter o seu pensamento. Quando você pensar o famoso e já citado acima: "Você não é daqui, meu caro..." Sugiro procurar saber de onde você realmente é. Para onde foram seus avós na juventude? De onde eles vieram? Onde residiam seus pais quando crianças? E principalmente, não se esqueça de que um dia, a terra em que você morar pode não ser a mesma que você nasceu. E isso não fará de você melhor, ou pior do que ninguém.
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